quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

A raiz de todo mal, ato I: Um passeio entre os mortos.

Sete de março de 1937.

Os dois mortos entraram na cidade em silêncio, carregando nas costas os espólios de sua vitória.

O primeiro era a morte encarnada. Duas fileiras de ossos grossos e pontudos esticavam-lhe a pele grossa e gordurosa das costas. A cabeça pendia para a esquerda como se ele estivesse possuido, a mandibula arqueada e primitiva era incapaz de conter as tres carreiras de dentes serrilhados e amarelos. Sua lingua era bífida e pegajosa, e sempre estava banhada no elixir rubro que conferia sentido a sua existência.
Os braços compridos e escamosos terminavam em mãos de três dedos enrugados e unhas compridas como punhais. E as pernas grossas e peludas eram curvadas como as de um sátiro, e os pés oleosos e cheios de póros sustentavam com dificuldade o corpo do guerreiro.

Era um estandarte – Um simbolo de glória – Nele estavam depositados séculos de tradição, o orgulho dos anciões e a força de um clã.

A segunda não era tão impressionante. Uma garota alta e encorpada de cabelos cor de cobre e sorrizo ferido. Seu corpo parecia sufocado no uniforme militar, e o pouco que sobrava de sua disposição esvaia-se com a perspectiva da caçada que era cada vez mais eminente. Ela mediu cuidadosamente as palavras e de súbito interrompeu a caminhada.
" Sabe maninho, seria muito mais simples atravessar a cidade se não ouvessem tantos gritos de pavor incontrolável a cada grupo de mortais que aparece no nosso caminho."

"Digo que não". A voz do Tzimisce era rouca e funebre, um silvo baixo que indicava a ela que neste momento ele era imune a seus apelos.

Ela teria forças pra protestar se não estivesse carregando as carcaças de quatro jovens "anarquistas" nas costas. Uma única haste de madeira atravessava o peito dos quatro, tornando o transporte ainda mais exaustivo.
O guerreiro, por sua vez, carregava uma massa de ossos moles e pastosos que, pelas contas da garota, deveriam um dia ter sido sete ou oito cainitas.
Aos olhos dela, isso tudo era um esforço inutil. Dachau tinha pelo menos trinta prisioneiros, Auschwitz, sessenta, e só Caim sabia dizer quantas almas infortunadas habitavam a "sala de troféus" do carcere da carne. Era estratégicamente inviável manter tantos inimigos tão próximos. Mesmo que a possibilidade de um ataque a um campo de concentração fosse extremamente remotas, elas ainda existiam.
Os anciões da liga orádea queriam o fim da ocupação imediatamente. Os feiticeiros de Viena podiam interromper seu silêncio a qualquer instante, e assim que a guerra interna dos Brujah soviéticos acabasse, eles poderiam dedicar-se ha uma nova empreitada.
Passos apressados quebraram seu devaneio. Ela proferiu um sibilo baixo e seu irmão respondeu imediatamente. Os prisioneiros foram depositados no chão com extremo cuidado, e a guerreira prostrou-se como um animal e começou a farejar.
Ela sentiu o cheiro da vitae e do medo. Estavam feridos e cansados, ouviu uns poucos sussurros angustiados e pela velocidade dos passos imaginou o armamento que carregavam.

"Doze. Poloneses. Mortais. Duas quadras ao oeste."

O guerreiro contraiu os ossos da coluna e fez duas pontas serrilhadas saltarem do lugar em que um dia houveram mamilos. Não houve tempo para perguntar se isso era necessário ou se era apenas uma luxúria. Em um segundo o Tzimisce iniciou sua corrida.
Para o desânimo da vampira, a noite estava apenas começando.

2 comentários:

  1. Legal os contos. Bem sombrios como devem ser. Já joguei Vampiro há muito tempo. Pretendo ver como é o novo mundo das trevas (não conheço) esse ano, heheheeh

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  2. Eu recomendaria que você desse mais uma chance ao "antigo" mundo das trevas.
    Recentemente foi lançada uma edição comemorativa de vinte anos do jogo, com regras atualizadas e polidas.

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