terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Adalbrecht, Ato III: Uma lição sobre a vida, a morte e o medo.


Não sei quanto tempo eu levei para parar de vomitar e chorar. A imagem do corpo retalhado se recusava a abandonar meus pensamentos e mesmo quando compreendi que não havia nada há ser feito, algo dentro de mim se recusava a compreender a magnitude da lição.

O mestre me observava, imóvel, e aparentemente desinteressado no surto de horror e emoções em que fui mergulhado.

"Levanta-te, criança, pois é hora da segunda lição"

Minhas pernas tremeram e eu senti minhas calças umedecerem. Depois veio o cheiro azedo. Se eu ainda tivesse o que vomitar, eu teria o feito.

Apoiei minhas mãos no chão para conseguir ficar de pé. Respirei fundo e tentei parar de soluçar. Não funcionou. O vampiro ignorou meu lamento e prosseguiu com o ensinamento.

"Temer o destino é inútil. Se você não cultivar seu poder, a ampulheta ou o infortúnio vão triunfar. No abismo não há morte ou medo. Há apenas o frio e a escuridão. Você será um herdeiro do abismo, esqueça seu medo e não derrame uma única lagrima por aqueles que são presos ao mundo da carne. Eles são inferiores e indignos, e, de uma maneira ou de outra, condenados a perecerem. Lembre-se, sem poder, a força é inútil."

Eu não reagi as palavras severas. Apenas tentei absorver as verdades alienígenas da existência.

"Se não fosse por meu poder, a criança teria sido vitima da adaga, da doença, da fome ou do tempo. Chorar pela morte de alguem fadado a morrer faz tanto sentido quanto chorar pelo nascimento de alguem fadado a nascer. É um insulto ha seu intelecto."

Eu não poderia, nunca, salvá-la, eu sabia que em algum momento eu iria ser tragado para o sangue e para a noite, e eu teria que abandoná-la. Apesar de inevitável, era inútil chorar.

Deus, como eu queria ter a invulnerabilidade de meu mestre, como eu invejava a imunidade que ele tinha a lágrimas e ao medo.

Era o abismo, era o conforto imortal no nada. Era a eterna morada de seus filhos e o eterno carcere de seus inimigos.

"Não há verdades ou mentiras no abismo, só existe a escuridão, que tudo consome e que tudo governa. Seja um de seus filhos ou pereça frente a seu poder indomável. Não há lágrimas ou sofrimento, apenas a mais pura das certezas: Não há como escapar."

" Venha comigo."

Não houve tempo para questionar ou protestar. A escuridão começou a borbulhar em meus pés e cobriu meu corpo por completo. Senti o ar queimando em meus pulmões e meus olhos quase serem arrancados da face enquanto meu corpo era deslocado pela masmorra.

Quando a escuridão recuou, eu gritei mais uma vez. Agora a lição fazia sentido.

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