Uma pequena história sobre um favor prestado a alguém que não pertencia ao sangue e a interação entre meus Lasombra e meus Malkavian, em três partes
Sou movimento, oblíquo e inconstante.
Mergulho minha Forma Espelhada na realidade primária. Um
corpo a quem pertence minha vontade. Penso, manifesto, faço-me carne.
Encontro-me em um lugar enlouquecido. Sons mecânicos ecoam
por corredores amarelados que cheiravam a urina e inconstância. Uma presença quase-morta
me acolhia. Um eco jovem,um sussurro de consciência mordiscando a mortandade.
Deslizo por salões inquietos. Em meu caminho, mortais em
vestes brancas tremem de pavor. Um coração para em algum lugar. Eles são cegos
a minha presença, mas ainda conseguem me sentir.
Alimento-me de pensamentos fragmentados e absorvo horrores
escondidos em mentes oprimidas. Vejo
nomes de poder e manifestações mesquinhas de ego e pretensa razão.
A vastidão quimérica do labirinto de corredores me absorve.
Mil aromas alienígenas me cegam e chamo o poder para encontrar o caminho.
Em meu peito podre pulsava a fome e a dor corpórea. Eu já
não mais sabia andar com a graciosidade de outrora, não mais sabia caçar
aqueles do sangue que me serviam de verdadeiro sustento. O preço pelo invólucro
de carne era alto.
Enfim encontro o quarto do escolhido. Atravesso o beiral da
porta aberta e sou surpreendido pelo choque da aura.
Ele estava lá, pequeno e ossudo. Um garotinho, não mais
velho do que Aquela que me é preciosa era no dia em que a trouxe para a noite. Era
pálido, fétido e doentio. Não tinha cabelos e sua pele purulenta parecia estar
desgrudando da face. Nos cantos da boca, feridas oleosas e vermelhas se faziam
presentes. Estava sobre uma cama imunda em meio a fezes e restos de comida.Um
dos olhos era branco e oleoso, o outro era cinzento e semicerrado. Estava
morrendo e por isso podia me contemplar.
“Você é o diabo?” Disse a voz errática da criança. Ele não
tremia e não dava sinais de que desviaria o olhar. Me aproximo e ele não recua.
“Eu sou Derek e empunho o cetro do rei do firmamento, e ajo
em seu nome. Sou Lasombra, rimador da hora tardia e sacerdote do fim de tudo.”
Respondo em um tom mental que só os despertos sabiam ouvir. Tento mover meus
lábios, mas já não me recordava do processo que formava palavras em carne.
Eu tinha tanta fome.
“O que quer de mim? Eu juro que não fiz nada” A sobrancelha
do olho vazado e os joelhos se levantam. Ele abraça as pernas e apóia o queixo
nos joelhos.
“Eu venho em nome do avô de teu avô, que uma dia foi meu
aliado. Tenho um dever a cumprir com aqueles de sua descendência.”
Rugidos metálicos ao longe, gaiolas se abrindo e animais
regojizando. Uma luz vermelha piscava. Um coração pulsava pela ultima vez.
Sangue ralo e sujo era derramado, não longe de mim.
“E...eles vão vir me pegar. Va-Vão me machucar e e-eu não q-q-quero” A criança chorava
agora. Ela não cheirava a medo ou desespero, só mágoa e ódio.
“Você esta desperto. Eles não podem te ferir. A carne é só
uma casca.” Minhas palavras não surtiam efeito. Não fosse ele descendente de
Tethanon, eu violaria seus pensamentos e o forçaria a entender. Mas eu não
podia. Sua mente estava ferida e além do meu alcance.
“E-eu...eu não posso fugir, não tenho pra onde fugir”
Negação. A condição natural da mortalidade
“Você não esta preso. Não existem paredes além dos espelhos,
e os espelhos se curvam diante daqueles que olham para si mesmos. Não existem
muros ou portas ou grades, olhe-se no espelho e entenda o caminho.”
Minhas palavras finalmente o tocam. Seu rosto se levanta e
pende para os lados como se estivesse solto do pescoço. O olho bom gira para
trás e a língua, suja e fibrosa, escapa pelo canto da boca. Ele baba antes de
começar a rir histericamente e ouço passos se aproximando.
“MAS...O ESPELHO...ESTA QUEBRADO”
Continua.
Nenhum comentário:
Postar um comentário