-- Breve texto sobre misticismo do abismo em ação no Astral. --
Era tarde e eu estava morto.
Eu era torre de Noite Escura. Já não tinha um corpo de carne
há muito tempo. Não me recordava do que costumava ser e sentir.
Eu estava em um lugar sem cor. Uma floresta insana perdida
na inexistência. O Astral. Ao meu redor, estranhas macieiras ossudas despontavam
a esmo. Seus frutos eram corpos infantes e
inchados. Eles viviam, moribundos, e murmuravam versos de decadência em
uníssono.
Cordões de prata ligavam os frutos-crianças, eles vibravam a
cada novo verso, como se puxados por um titereiro invisível, a supra vontade do
não-existir, o além das consciências, o vento no fim do tempo.
Torno-me pensamento e ação. Crio o Verbo e chamo o Poder.
Deixo de Permanecer e me vejo em uma encruzilhada entre muitas pontes e muitas
vontades. Projeto o caminho em dimensões que não mais existiam e, no Escuro, invoco
meu direito de sacerdote.
A noite nasce além do firmamento e as pontes são engolidas.
Treva líquida borbulha em dimensões não existentes e os caminhos sangram. Sinto
a dor dos mundos que poderiam ter existido mordiscar minha alma condenada. Uma
infinidade de gritos sufocados no carrossel do inevitável. Portões violados e
selados.
Algo morre no horizonte inalcançável. Eu suspiro e meu
caminho se torna verdadeiro. A mandíbula do abismo se abre e o piche etéreo se
torna condutor da verdade. Finos braços de nanquim escapam pelo portal.
Manifestações do sangue, manifestações do poder.
Uma velha vontade ruge e o feitiço se completa. Aquela
região era agora consagrada aos Verdadeiros Mortos Abortados.
Em outro plano, em outro tempo e lugar, um homem pequeno enlouquecia
e clamava pelos Antigos. Projeto meu nome em sua mente e ele me pertence.
Instruo-o no caminho. Ele faz sacrifícios de sangue para Dagon e oferece seu
corpo em holocausto.
Concentro-me no conceito da ausência do sopro. Evaporo.
Torno-me uma entidade do não-estar.
Morro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário